martes, 7 de septiembre de 2010

Do contraditório como terapêutica de libertação.


Texto extraído de citaçoes e pensamentos de Fernando Pessoa.


...O homem disciplinado e culto faz de sua sensibilidade e de sua inteligência espelhos do ambiente transitório: é republicano de manhã, monárquico ao crepúsculo; ateu sob o sol descoberto e católico ultramontano a certas horas de sombra e de silencio; e, não podendo admitir senão Mallarmé [1] àqueles momentos do anoitecer citadino em que desabrocham as luzes, ele deve sentir todo o simbolismo uma invenção de louco quando, ante uma solidão de mar, ele não souber de mais do que da Odisséia.

Convicções profundas, só as têm as criaturas superficiais. Os que não reparam para as coisas quase que as vêem apenas para não esbarrar com elas, esses são sempre da mesma opinião, são os íntegros e os coerentes. A política e a religião gastam dessa lenha, e é por isso que ardem tão mal ante a Verdade e a Vida.

Quando é que despertaremos para a justa noção de que política, religião e vida social são apenas graus inferiores e plebeus da estética – a estética dos que ainda a não podem ter? Só quando uma humanidade livre dos preconceitos de sinceridade e coerência tiver acostumado as suas sensações a viverem independentemente, se poderá conseguir qualquer coisa de beleza, elegância e serenidade na vida.


[1] Stéphane Mallarmé se utilizava dos símbolos para expressar a verdade através da sugestão, mais que da narração. Sua poesia e sua prosa se caracterizam pela musicalidade, a experimentação gramatical e um pensamento refinado e repleto de alusões que pode resultar em um texto às vezes obscuro.

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